Poema do Cume, de Laurindo Rabelo

Embora muitos acreditem que o famoso “Poema do Cume” é de um autor desconhecido, o gênio por trás dessa sátira que tira gargalhadas de muitos leitores mesmo depois de 150 anos é o médico, professor e poeta da segunda geração do romantismo brasileiro Laurindo Rabelo (1826-1864).

O nome verdadeiro do “Poema do Cume” é “As Rosas do Cume”, e o sentido dele é exatamente esse que você está pensando. Como poeta, Laurindo Rabelo tem poemas melancólicos e românticos, mas também tem um lado satírico e erótico. E o poema abaixo é uma prova disso…

As rosas do Cume, de Laurindo Rabelo

No cume daquela serra
Eu plantei uma roseira
Quanto mais as rosas brotam
Tanto mais o cume cheira

À tarde, quando ao sol posto
O vento no cume beija
Vem travessa borboleta
E as rosas do cume deixa

No tempo das invernias
Que as plantas do cume lavam
Quanto mais molhadas eram
Tanto mais no cume davam

Quando cai a chuva fina
Salpicos no cume caiem
Abelhas no cume entram
Lagartos do cume saem

Mas, se as águas vêm correndo
O sujo do cume limpam
Os botões do cume abrem
As rosas do cume brincam

Tenho, com certeza agora
Que no tempo de tal rega
Arbusto por mais mimoso
Plantado no cume, pega

E logo que a chuva cessa
Ao cume leva alegria
Pois volta a brilhar depressa
O sol que no cume abria

À hora de anoitecer
Tudo no cume escurece
Pirilampos do cume brilham
Estrelas no cume aparecem

E quando chega o Verão
Tudo no cume seca
O vento o cume limpa
E o cume fica careca

Vem, porém, o sol brilhante
E seca logo em catadupa
O mesmo sol, a terra abrasa
E as águas do cume chupa

As rosas do cume espreitam
Entre as folhagens d’além
Trazidas da fresca brisa
Os cheiros do cume vêm

E quando chega o Inverno
A neve no cume cai
O cume fica tapado
E ninguém ao cume vai

No cume dessa montanha
Tem um olho de água à beira
É uma água tão cheirosa
Que a multidão ansiosa
O olho do cume cheira

Análise do poema

O poema tem dois lados (como o cume): um romântico, descrevendo uma cena bucólica e pitoresca, descrevendo a beleza e a fragilidade da natureza em uma serra, as diferentes estações do ano, transmitindo uma sensação de tranquilidade, admiração, contemplação, com a natureza sendo uma fonte de prazer.

O outro lado, erótico e satírico, descreve uma fonte de prazer… diferente. O poeta faz uma brincadeira com a pronúncia da palavra “cume”, associando-o justamente àquilo que você está pensando. Indo direto ao ponto: ao fiofó.

A leitura do poema tem uma cadência interessante tanto pela presença de rimas quanto pelo ritmo do poema, que tem versos de sete sílabas poéticas, sendo, portanto, uma redondilha maior.

Sobre Laurindo Rabelo

Laurindo José da Silva Rabelo nasceu em 8 de julho de 1826 no Rio de Janeiro. Foi médico, professor e poeta da segunda geração do romantismo brasileiro. Nasceu em uma família pobre, mas conseguiu formar-se em medicina, começando o curso no Rio de Janeiro e terminando-o em Salvador. Tendo interesse pela carreira militar, tornou-se médico no Corpo de Saúde do Exército.

Como poeta, destacou-se mais pelo seu lado satírico e erótico, principalmente pelo poema “As Rosas do Cume”. Porém, sua obra poética é vastíssima, indo de sonetos a hinos com características bem marcantes da segunda geração do romantismo, conhecida como “Ultrarromantica” ou “Byronesca”: a idealização da mulher, um sentimento de amargura, um desejo de morrer encontrar o descanso etc.

Levava uma vida boêmia e tinha grande capacidade de improvisação, tornando-se conhecido nos bares do Rio de Janeiro pelos repentes (improviso cantado) e modinhas. Segundo Manuel Bandeira, tinha uma aparência magra e desengonçada, o que lhe garantiu o apelido “Poeta Lagartixa”.

Infelizmente, Laurindo morreu bastante jovem, com apenas 38 anos, no dia 28 de setembro de 1864, vítima de problemas cardíacos. Publicou em vida apenas um livro: Trovas, lançado originalmente em 1853.

Biografia com informações de Wikipédia.

Perguntas frequentes sobre o poema do Cume

Quem é o autor do Poema do Cume?

Como vimos nesta matéria completa, o autor do poema “As Rosas do Cume” é Laurindo José da Silva Rabelo, médico, professor e poeta do romantismo brasileiro que nasceu no Rio de Janeiro em 8 de julho de 1826 e morreu em 28 de setembro de 1864. Sua poesia ficou conhecida especialmente por seu caráter cômico e humorístico, como vimos nesse exemplo.

Qual a estrutura do verso do Poema do Cume?

Os versos do “Poema do Cume” foram compostos em hexassílabos, ou seja, versos que têm seis sílabas poéticas. Vamos analisar as duas primeiras estrofes para confirmar isso:

/No/ cu/me/ da/que/la/ se/rra (6 sílabas)
/Eu/ plan/tei/ u/ma/ ro/sei/ra (6 sílabas)
Quan/to/ mais/ as/ ro/sas/ bro/tam (6 sílabas)
Tan/to/ mais/ o/ cu/me/ chei/ra (6 sílabas)

À/ tar/de/, quan/do ao/ sol/ pos/to (6 sílabas)
O/ ven/to/ no/ cu/me/ bei/ja (6 sílabas)
/Vem/ tra/ve/ssa/ bor/bo/le/ta (6 sílabas)
E as/ ro/sas/ do/ cu/me/ dei/xa (6 sílabas)

Lembrando que, na escansão (nome dado a esse estudo das sílabas poéticas de um poema) da Língua Portuguesa, sílabas que terminam e começam em vogais se juntam com frequência, como em “qua/do ao/ sol pos/to”, contabilizando apenas uma sílaba. Além disso, na escansão em português do Brasil, não consideramos a última sílaba poética, que é descartada da contagem.

É exatamente esse rigor da divisão de sílabas poéticas do verso que dá ao poema essa cadência interessante na leitura, fazendo-o soar como uma música.

Todo poema de Laurindo Rabelo é cômico/obsceno?

Não! Na verdade, a maior parte deles são poemas que abordam assuntos comuns do romantismo brasileiro, como saudade, amor não correspondido e morte.

Por exemplo, o poema abaixo é “O Desalento”, escrito por Rabelo e dedicado ao seu amigo, Leopoldo Luiz da Cunha:

Quando eu morrer, minha morte
Não lamentes, caro amigo,
Que o sepulcro é um jazigo
onde eu devo descansar;
A minha triste existência
É tão pesada, é tão dura,
Que a pedra da sepultura
Já me não pode pesar.

Uma lágrima, um suspiro,
Eis quanto custa o morrer;
Custa-nos sempre o viver
Prantos, suspiros, sem fim!
Que tormento fora a vida,
Se não fosse transitória!?…
Não me risques da memória,
Porém não chores por mim.

Enchem trevas o sepulcro,
Mas ninguém delas se queixa;
Quando o morto os olhos fecha,
Não quer luz, quer sossegar;
Aquele fundo silêncio,
Aquele extremo abandono,
Dão-lhe tão profundo sono,
Que nem pode despertar.

Já tive medo da morte,
Agora tenho da vida;
Sinto minha alma abatida,
Sem vigor o coração;
Já cansado de viver,
Para a morte os olhos lanço;
Vejo nela o meu descanso,
A minha consolação.

Neste poema, não há nenhum duplo sentido com conotação obscena ou erótica: é apenas uma terna mensagem dedicada a um amigo, pedindo para que ele não chore quando o eu-lírico morrer, pois finalmente encontrará o descanso após uma vida de sofrimentos.

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Alexandre Garcia Peres

Criador do site Literatura Online e Redator, Editor e Analista de SEO com três anos de experiência. Formado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), com foco em literatura e TCC em Paulo Leminski. Fez um ano de especialização em Teoria da Literatura e sua maior área de interesse é a poesia brasileira, principalmente os poetas da segunda e terceira geração do romantismo.

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