Ode ao Dois de Julho, de Castro Alves – Análise

Em “Ode ao Dois de Julho” (ou “Dous” de Julho, como grafado na versão original), Castro Alves faz uma espécie de poema épica em homenagem à Independência da Bahia, ocorrida em 2 de julho de 1823. Nessa data em questão, houve um conflito intenso entre as forças de Portugal e as do Brasil, resultando na expulsão dos europeus e na consolidação da Independência do Brasil.

Na primeira estrofe vemos uma descrição do campo de batalha, nos cerros da Bahia, com um anjo da morte costurando uma mortalha (um pano funerário) em Pirajá, onde aconteceu um dos conflitos decisivos. Nesse primeiro momento ainda resta a dúvida: qual dos dois gigantes vencerá, Brasil ou Portugal?

Em seguida, Castro Alves compara a batalha a um circo, como ao Coliseu, famoso pelas lutas de gladiadores. Entretanto, não era uma batalha de dois povos, mas uma batalha entre dois ideais: o passado e o futuro, a escravidão ou a liberdade. A batalha se estende até que a “branca estrela matutina” surge nos céus, marcando o início de novos tempos. E uma voz surge logo em seguida: a voz da Liberdade, que se estenderia às gerações futuras, honrando os soldados que perderam a vida lutando por essa causa.

Leia o poema na íntegra, seguido de uma análise ainda mais aprofundada.

Ode ao Dois de Julho, de Castro Alves

Era no dois de julho. A pugna imensa
Travara-se nos cerros da Bahia…
O anjo da morte pálido cosia
Uma vasta mortalha em Pirajá.
“Neste lençol tão largo, tão extenso,
“Como um pedaço roto do infinito…
O mundo perguntava erguendo um grito:
“Qual dos gigantes morto rolará?!…”

Debruçados do céu… a noite e os astros
Seguiam da peleja o incerto fado…
Era a tocha — o fuzil avermelhado!
Era o Circo de Roma – o vasto chão!
Por palmas – o troar da artilharia!
Por feras – os canhões negros rugiam!
Por atletas – dous povos se batiam!
Enorme anfiteatro — era a amplidão!

Não! Não eram dois povos, que abalavam
Naquele instante o solo ensanguentado…
Era o porvir – em frente do passado,
A Liberdade – em frente à Escravidão,
Era a luta das águias — e do abutre,
A revolta do pulso – contra os ferros,
O pugilato da razão — com os erros,
O duelo da treva – e do clarão!…

No entanto a luta recrescia indômita…
As bandeiras — como águias eriçadas —
Se abismavam com as asas desdobradas
Na selva escura da fumaça atroz…
Tonto de espanto, cego de metralha,
O arcanjo do triunfo vacilava…
E a glória desgrenhada acalentava
O cadáver sangrento dos heróis!…

Mas quando a branca estrela matutina
Surgiu do espaço… e as brisas forasteiras
No verde leque das gentis palmeiras
Lá do campo deserto da batalha
Uma voz se elevou clara e divina:
Eras tu— Liberdade peregrina!
Esposa do porvir-noiva do sol!…

Eras tu que, com os dedos ensopados
No sangue dos avós mortos na guerra,
Livre sagravas a Colúmbia terra,
Sagravas livre a nova geração!
Tu que erguias, subida na pirâmide,
Formada pelos mortos de Cabrito,
Um pedaço de gládio — no infinito…
Um trapo de bandeira — n’amplidão!…

Análise do poema “Ode ao Dois de Julho”

Este poema de Castro Alves, intitulado “Ode ao Dois de Julho”, é um hino à independência da Bahia e ao amor pela liberdade.

O poema é marcado pela exaltação aos heróis que lutaram para livrar o país do jugo português. Através de metáforas e simbolismos, Alves transporta o leitor para o campo de batalha, transmitindo a grandiosidade e o peso histórico desse momento.

A “pugna imensa “travada nas colinas da Bahia é descrita como um embate entre gigantes, um confronto entre a Liberdade e a Escravidão, entre o bem e o mal. Ao personificar a Liberdade como a “esposa do porvir” e a “noiva do sol”, Alves ressalta sua importância como um ideal a ser alcançado e preservado.

O poema apresenta várias imagens vívidas que ressaltam a intensidade da batalha. O fuzil avermelhado é comparado a uma tocha em um circo romano, enquanto os canhões rugem como feras. A descrição do cenário como um enorme anfiteatro amplia a grandiosidade do confronto, e os astros do céu acompanham a luta como espectadores.

A luta é representada como incessante e indomável, com as bandeiras se abismando como águias e os combatentes continuando a batalha, mesmo diante da dúvida e da incerteza. A glória e a morte dos heróis são entrelaçadas, reforçando o sacrifício necessário para se alcançar a liberdade.

No entanto, apesar do embate sangrento, o poema traz uma nota de esperança. Com o amanhecer, a voz da Liberdade se eleva clara e divina, anunciando sua vitória. A Liberdade é personificada como uma figura sagrada, com os dedos ensopados no sangue dos heróis passados e presente, simbolizando sua dedicação à causa da independência.

Ao final, Alves exalta a Liberdade como a força capaz de transformar a terra, sagrando-a livre e garantindo um futuro melhor para as gerações vindouras. A imagem do pedaço de gládio erguido no infinito e o trapo de bandeira ao vento representam a conquista do ideal de liberdade em sua plenitude.

Pintura "O Primeiro Passo para a Independência da Bahia", de Antônio Parreiras. Ilustrando o poema "Ode ao Dois de Julho", de Castro Alves.
Pintura "O Primeiro Passo para a Independência da Bahia", de Antônio Parreiras. Ilustrando o poema "Ode ao Dois de Julho", de Castro Alves.
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Alexandre Garcia Peres

Criador do site Literatura Online e Redator, Editor e Analista de SEO com três anos de experiência. Formado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), com foco em literatura e TCC em Paulo Leminski. Fez um ano de especialização em Teoria da Literatura e sua maior área de interesse é a poesia brasileira, principalmente os poetas da segunda e terceira geração do romantismo.

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