Consolo Supremo, de Auta de Souza – Análise

O poema “Consolo Supremo”, de Auta de Souza, é um manifesto que confronta a melancolia da existência com uma visão resiliente da esperança, misturando temas de sofrimento, redenção e a constante busca da alma por significado.

“Consolo Supremo”, de Auta de Souza

Os tristes dizem que a vida
É feita de dissabores
E a alma verga abatida
Ao peso das grandes dores.

Não acredito que seja
Assim como dizem, não…
Ai daquele que deseja
Viver sem uma ilusão!

Se há noites frias, escuras,
Também há noites formosas;
Há risos nas amarguras;
Entre espinhos nascem rosas.

E rosas também cobriram
O lenho santo da Cruz,
Quando os espinhos cingiram
A cabeça de Jesus.

Rosas do sangue adorado
– Fonte de graça e de fé –
Brotando do rosto amado
Do Filho de Nazaré.

Ó alma triste, chorosa
Como uma dália no inverno,
Despe da mágoa trevosa
O negro cilício eterno!

Enquanto vires estrelas
Do Céu no imenso sacrário,
Na terra flores singelas
E uma Cruz sobre o Calvário;

Enquanto, mansa, pousar
A prece nos lábios teus,
E souberes murmurar
Com as mãos unidas: meu Deus!

Não digas que à luz vieste
Para chorar e sofrer,
E como a plantinha agreste
Sonhar um dia e… morrer…

Não digas, pobre querida!
Mesmo se a dor te magoa;
É sempre feliz na vida
A alma que é pura e boa.

Análise do poema “Consolo Supremo”

O poema “Consolo Supremo” de Auta de Souza evoca de maneira poética o contraste entre o pesar humano e o poder do consolo.

A abertura aponta a percepção popular de que a vida é um amontoado de desilusões – algo que a poetisa prontamente contesta. A descrença de Souza no pessimismo desenfreado sugere a necessidade de “ilusão”, ou mais precisamente, a esperança – um pilar essencial para a resiliência humana.

Auta de Souza faz uso de imagens noturnas, “frias, escuras”, e as contrapõe à beleza da noite e à capacidade de encontrar “risos nas amarguras”. Esta jornada do escuro para a luz é simbolizada pela metamorfose da flor: “Entre espinhos nascem rosas.”

O desenvolvimento do simbolismo das rosas alcança o seu ápice na alusão cristã – as rosas que “cobriram o lenho santo da Cruz” como um lembrete da redenção e sacrifício que são capazes de ofuscar a dor física representada pelos espinhos.

A figura de Jesus, repetida no poema, ancorada na sua humanidade “amada”, irmã daquela a quem o poema se dirige, emerge como o exemplo máximo de dor transformada em amor e, fundamentalmente, insinua a possibilidade de redenção e um consolo supremo para além do sofrimento.

O poema nos induz a uma rejeição ao desespero, ao “cilício eterno” de mágoas. A “dália no inverno”, uma flor conhecida por sua fragilidade diante do frio, personifica a alma em desespero, a quem a poetisa aconselha a observar as belezas naturais e cósmicas – uma escolha de palavras profundamente enraizada no Romantismo, sugerindo um remédio, uma transcendência através da natureza e da fé.

“A prece nos lábios teus,” e a invocação humilde ao divino, ilustram uma ligação direta entre o indivíduo e o sagrado. A conclusão do poema se apresenta como uma negação final ao niilismo: é no cerne da pureza e bondade que reside a verdadeira felicidade, um estado intocável pela dor exterior.

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Alexandre Garcia Peres

Criador do site Literatura Online e Redator, Editor e Analista de SEO com três anos de experiência. Formado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), com foco em literatura e TCC em Paulo Leminski. Fez um ano de especialização em Teoria da Literatura e sua maior área de interesse é a poesia brasileira, principalmente os poetas da segunda e terceira geração do romantismo.

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