O Ano sem Verão em que Mary Shelley escreveu Frankenstein

O verão de 1816, conhecido como “o ano sem verão”, transformou-se em um cenário de caos climático após a catastrófica erupção do Monte Tambora. Com o céu escurecido por cinzas vulcânicas e temperaturas bem baixas, enquanto muitos lutavam para sobreviver, a jovem Mary Shelley, isolada em uma casa à beira do Lago de Genebra com amigos como Lord Byron, encontrou nesse clima apocalíptico a inspiração para criar Frankenstein, uma história que desafiaria os limites da ciência e da moralidade humana.

O ano de 1816 na Europa

O ano de 1816 ficou conhecido como “o ano sem verão”. Esse fenômeno climático fora do comum foi causado pela erupção do Monte Tambora, na Indonésia, em abril de 1815. A erupção lançou toneladas de cinzas vulcânicas na atmosfera, sendo uma das mais violentas da história já registrada, causando uma queda global nas temperaturas.

O efeito foi sentido em todo o hemisfério norte, provocando um ano de colheitas fracassadas, fome e doenças. Na Europa, em especial, o verão foi marcado por chuvas torrenciais, geadas fora de época e um céu constantemente cinzento.

Os habitantes da época não tinham o conhecimento científico necessário para entender a causa desse clima caótico. Para muitos, parecia um castigo divino ou um prenúncio de tempos sombrios. O frio intenso, combinado com a escuridão persistente, criou uma atmosfera opressiva que influenciou não apenas o humor das pessoas, mas também a produção cultural e literária.

Em 1816, Mary Godwin (futura Mary Shelley) viajou para a Suíça com Percy Bysshe Shelley e um grupo de amigos, incluindo a meia-irmã Claire Clairmont. Perto dali, Lord Byron havia alugado a Villa Diodati, onde, forçados a permanecerem em ambientes fechados devido ao clima severo, o grupo se dedicou a escrever histórias.

O Encontro de Mary Shelley e Lorde Byron

Em maio de 1816, Mary Godwin, Percy Shelley, seu filho William, e Claire Clairmont (meia-irmã de Mary e amante de Lord Byron) viajaram para a Suíça. O objetivo era passar um verão agradável às margens do Lago de Genebra. No entanto, devido ao clima severo, as atividades ao ar livre eram quase impossíveis.

O poeta Lord Byron, uma das figuras mais influentes do romantismo inglês, já estava na região e alugou a Villa Diodati, uma mansão próxima ao local onde Mary e Percy Shelley estavam hospedados. Conhecido por sua poesia audaciosa e vida cheia de escândalos, Byron trouxe consigo seu médico pessoal, Dr. John Polidori. Ambos desempenhariam papéis importantes nas criações literárias daquele verão, com Polidori contribuindo para a literatura de terror ao escrever O Vampiro, considerado a origem do mito vampírico moderno.

O que começou como uma viagem de férias se transformou em um período de intensa introspecção, filosofia e criatividade. Sem a possibilidade de sair devido às tempestades constantes, o grupo passou muitas noites discutindo literatura, ciência e filosofia.

Mary Shelley recordaria mais tarde essas conversas como momentos intensos, especialmente os debates entre Percy Shelley e Lord Byron sobre a natureza da vida e a possibilidade de recriá-la artificialmente. Essas discussões filosóficas e científicas sobre a vida e a morte serviram para, mais tarde, criar a trama que Mary posteriormente desenvolveria em Frankenstein.

Além das discussões, uma das atividades favoritas do grupo era a leitura de contos de terror. Foi após a leitura de uma coletânea de histórias de fantasmas alemãs, Fantasmagoriana, que Byron sugeriu que cada um criasse sua própria história de terror. Esse desafio, lançado em uma noite fria e chuvosa, acabaria por inspirar Mary a escrever um dos romances mais assustadores e impactantes da literatura.

A inspiração para Frankenstein

Mary Shelley relatou, anos depois, que a inspiração para Frankenstein veio de uma espécie de sonho ou visão. Incapaz de dormir em uma noite agitada, sua mente começou a formar imagens vívidas e assustadoras. Ela visualizou “um estudante pálido de artes profanas” se dedicando à criação de uma criatura horrenda, um ser montado a partir de partes humanas. Em sua visão, Shelley viu o momento em que essa criatura, através de uma máquina poderosa, ganhava vida, movendo-se com um inquietante semblante de semi-vida.

Retrato de Mary Shelley à esquerda e capa do livro Frankenstein à direita, mostrando uma figura monstruosa caminhando em uma floresta escura iluminada por luzes sombrias.

Esse pesadelo foi o ponto de partida para a criação de Frankenstein. A obra não é apenas uma história de horror sobre um monstro, mas uma profunda reflexão sobre a natureza humana, o medo do desconhecido e as implicações éticas da ciência. Em uma época em que a revolução científica e tecnológica gerava tanto entusiasmo quanto preocupação, Mary Shelley, com apenas 18 anos, capturou em sua narrativa temas atemporais, como a solidão, o abandono e a responsabilidade moral que surgem com a criação de algo novo.

Frankenstein vai além de uma simples história de terror; é uma crítica à arrogância humana, ao desejo desenfreado de poder e ao impulso de desafiar as leis da natureza. O “monstro” de Shelley é uma metáfora poderosa para os perigos da ciência sem ética e para as consequências imprevisíveis de brincar de Deus. A história é uma advertência sobre os limites da ambição e os efeitos destrutivos que o conhecimento mal utilizado pode ter, tanto para o criador quanto para a criação.

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