No poema Celeste, de Auta de Souza, a essência de uma alma que se volta às estrelas surge no diálogo com uma criança, símbolo de pureza e esperança. Seus versos criam um retrato que transcende o visual, alcançando a esfera do espiritual e do emotivo.
Celeste, de Auta de Souza
Eu fiz do Céu azul minha esperança
E dos astros dourados meu tesouro…
Imagina por que, doce criança,
Nas noites de luar meus sonhos d’ouro!
Adivinha, se podes, quanto é mansa
A luz que bola sob um cílio de ouro.
E como é lindo um laço azul na trança
Embalsamada de um cabelo louro!
Imagina por que peço, na morte,
– Um esquife todo azul que me transporte,
Longe da terra, longe dos escolhos…
Imagina por que… mas, lírio santo!
Não digas a ninguém que eu amo tanto
A cor de teu cabelo e dos teus olhos!
Análise do poema “Celeste”
“Celeste” expõe um diálogo íntimo entre o eu lírico e uma criança, ocorrendo uma interação onde o primeiro convida o segundo a compreender a profundidade de suas emoções e desejos.
A natureza celeste, elemento muito presente no texto, é o cenário onde se cria a esperança – o Céu azul não é apenas uma expansão física, mas um recipiente de sonhos e aspirações. A cor azul, simbolizando tranquilidade e infinidade, permeia o poema, ligando a visão de mundo da autora a um desejo por algo que transcende a materialidade.
“Asta dourada” e a luz que “bola” sob “um cílio de ouro” são imagens que infundem a poesia com um brilho aureolado, quase místico. O ouro, tradicionalmente associado ao que é eterno e valioso, aqui se transforma em uma suavidade quase infantil, capturada na imagem da luz filtrada através dos cílios da criança.
A terceira estrofe aprofunda a prece pela morte, desejando um esquife azul – ou seja, um caixão azul, veículo final de transporte e símbolo da passagem. Aqui, longe dos “escolhos” terrenos, o eu lírico anseia por um desprendimento final que o transporte para um estado de existência onde a pureza céu-celestial se torna uma manifestação física da paz interior que ela tanto deseja.
O pedido que termina o poema – guardar o segredo de amor pela cor do cabelo e dos olhos da criança – representa o apreço por tudo que é sereno e puro, uma mistura sincera do terreno com o divino, do íntimo pessoal com a vastidão do universo, marcando um tópico simbólico que conecta a dimensão humana à divina.