O poema “Sonho da Bohemia”, escrito pelo renomado poeta Castro Alves, traz em sua essência a busca pela liberdade e pelo amor. Em versos líricos, a poesia retrata a fuga de um casal, representando o anseio de escapar das restrições e convenções sociais. Neste texto, faremos uma análise detalhada do poema, explorando seus sentidos, metáforas e simbolismos subjacentes.
“Sonho da Bohemia”, de Castro Alves
Dama Negra
VAMOS, meu anjo, fugindo,
A todos sempre sorrindo,
Bem longe nos ocultar…
Como boêmios errantes,
Alegres e delirantes
Por toda a parte a vagar.
Há tanto canto na terra
Que uma vida inteira encerra!…
E que vida!… Um céu de amor!
Seremos dois passarinhos,
Faremos os nossos ninhos
Lá onde ninguém mais for.
Uma casinha bonita,
Lá na mata que se agita
Do vento ao mole soprar,
Com as folhas secas da selva
Com o lençol verde da relva
Oh! quanto havemos de amar!…
De manhã, inda bem cedo,
Hás de acordar, anjo ledo,
Junto do meu coração…
Ao canto alegre das aves
As nossas canções suaves,
Quais preces se ajuntarão.
Passearemos à sesta…
Sonharemos na floresta,
Sempre felizes, meu Deus!…
Nalma lânguida esteira,
Quanta cantiga faceira
Ouvirei dos lábios teus!…
E à noite, no mesmo leito
Reclinada no meu peito,
Hei de ouvir os cantos teus.
A cada estrofe bonita
No teu seio, que palpita,
Terás cem beijos, por Deus!
Farei poesias ou versos
Aos teus olhinhos perversos
Aos teus “anhos, meu bem!
Tu cantarás, é Manola,
Aquela moda espanhola
Que tantos requebros tem!
Depois, que lindas viagens!…
Veremos novas paisagens,
No sul, no norte, onde for…
Voando sempre, querida,
Coa primavera da vida,
Coa primavera do amor.
Vamos, meu anjo, fugindo,
A todos sempre sorrindo
Bem longe nos ocultar.
Como boêmios errantes
Que repetem delirantes:
“Pra ser feliz basta amar”!
Análise do poema “Sonho da Bohemia”
O poema “Sonho da Bohemia” expressa uma clara fuga da sociedade e das convenções impostas. O eu lírico, por meio da figura do “anjo”, busca uma vida de liberdade e amor, distante dos olhares e julgamentos alheios. Através de uma linguagem leve e musical, o poeta evoca a imagem de boêmios errantes, simbolizando a busca por uma vida despojada e prazerosa.
Ao mencionar “tanto canto na terra”, Castro Alves mostra a diversidade que a vida oferece, convidando a aproveitá-la integralmente. A referência aos passarinhos e ninhos representa a construção de um lar onde ninguém mais esteja presente, oferecendo intimidade e proteção ao casal.
A escolha de uma “casinha bonita, lá na mata que se agita” evidencia o desejo de proximidade com a natureza, de viver em harmonia com o ritmo sutil do vento e as folhas secas da selva. A presença do lençol verde da relva reforça a ideia de um amor intenso e vibrante.
A sinestesia presente no verso “quanta cantiga faceira ouvirei dos lábios teus” mescla o som das canções com o prazer de ouvi-las, enfatizando a alegria e a cumplicidade do casal. Já no verso “a cada estrofe bonita no teu seio, que palpita, terás cem beijos, por Deus!”, há um apelo erótico e sensual, revelando a entrega completa dos amantes.
O poeta ainda faz uma referência à música e à dança espanhola, sugerindo o ritmo envolvente e apaixonado que marca a relação entre os dois. Ao mencionar as “lindas viagens” e as “novas paisagens”, Castro Alves ressalta a essência nômade do casal, representando a amplitude do amor e a possibilidade de descobertas constantes.
O poema encerra-se com a repetição do verso “vamos, meu anjo, fugindo, a todos sempre sorrindo, bem longe nos ocultar”, ressaltando a importância de proteger e preservar a relação de dois indivíduos que se encontram na paixão e na liberdade.
Além disso, convém destacar que o poema é dedicado a uma suposta “Dama Negra” (possivelmente a atriz Eugênia Câmara, com quem o poeta teve um caso), assim como outros poemas, como Gondoleiro do Amor e Meu Segredo.
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