Fio Partido, de Auta de Souza – Análise

Share

O poema “Fio Partido”, de Auta de Souza, fala da morte e da libertação. Escrito no início do século XX, este poema reflete a busca por compreensão e aceitação dos ciclos da vida, em meio a vivências de perda e dor.

Fio Partido, de Auta de Souza

Fugir à mágoa terrena
E ao sonho, que faz sofrer,
Deixar o mundo sem pena
Será morrer?

Fugir neste anseio infindo
À treva do anoitecer,
Buscar a aurora sorrindo
Será morrer?

E ao grito que a dor arranca
E o coração faz tremer,
Voar uma pomba branca
Será morrer?

Lá vai a pomba voando
Livre, através dos espaços…
Sacode as asas cantando:
“Quebrei meus laços!”

Aqui, n’amplidão liberta,
Quem pode deter-me os passos?
Deixei a prisão deserta,
Quebrei meus laços!

Jesus, este vôo infindo
Há de amparar-me nos braços
Enquanto eu direi sorrindo:
Quebrei meus laços!

Janeiro, 1901

Análise do poema “Fio Partido”

O poema “Fio Partido” faz uma reflexão sobre a morte não como um fim, mas como uma libertação da dor terrena. A sua estrutura divide-se em duas partes: a primeira, que questiona a natureza da morte (“será morrer?”, e a segunda, que parece encontrar na imagem da pomba um símbolo de liberdade e escape das amarras da vida (“quebrei meus laços”).

A autora utiliza a repetição das perguntas “Será morrer?” ao final de cada estrofe na primeira parte para enfatizar a dúvida e a incerteza que rondam o tema da morte. Estas perguntas ajudam a construir uma atmosfera de introspecção, convidando o leitor a refletir junto com ela.

A imagem da “pomba branca” que surge na segunda parte do poema é profundamente simbólica. Tradicionalmente, a pomba é um símbolo de paz e da alma que se liberta, o que reforça a ideia de morte como um ato de libertação. A repetição do versos “Quebrei meus laços!” ecoa um sentimento de alívio e de desprendimento das dores da vida, contradizendo o temor inicial da morte.

Interessante notar é a maneira como Auta de Souza fecha o poema com a incorporação de uma dimensão espiritual, mediante a menção a Jesus. Ela sugere uma crença na proteção divina além da morte, reforçando a noção de que a morte é apenas uma transição para algo mais grandioso e libertador.

Pintura "A Golden Thread", de Strudwick. Mostra as três moiras, figuras mitológicas gregas responsáveis por tecer o "fio da vida", que é cortado no momento em que a pessoa morre.
Pintura "A Golden Thread", de Strudwick.
Avatar photo

Alexandre Garcia Peres

Criador do site Literatura Online e Redator, Editor e Analista de SEO com três anos de experiência. Formado em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR), com foco em literatura e TCC em Paulo Leminski. Fez um ano de especialização em Teoria da Literatura e sua maior área de interesse é a poesia brasileira, principalmente os poetas da segunda e terceira geração do romantismo.

You may also like...

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Teoria liga Anne Hathaway a William Shakespeare 5 obras da Literatura Gótica que você precisa conhecer 8 curiosidades sobre Hamlet que você não sabia A sinistra maldição na cova de William Shakespeare Rousseau: 10 pontos para entender a Desigualdade