A Volta da Primavera, de Castro Alves

A Volta da Primavera

Aime, et tu renaítras; fais-toi fleur pour éclore,
Après avoir souffert, il faut souffrir encore;
Il faut aimer sans cesse, après avoir aimé.
A. DE MUSSET

AI! Não maldigas minha fronte pálida,
E o peito gasto ao referver de amores.
Vegetam louros — na caveira esquálida
E a sepultura se reveste em flores.

Bem sei que um dia o vendaval da sorte
Do mar lançou-me na gelada areia.
Serei… que importa? o D. Juan da morte
Dá-me o teu seio — e tu serás Haidéia!

Pousa esta mão — nos meus cabelos úmidos!…
Ensina à brisa ondulações suaves!
Dá-me um abrigo nos teus seios túmidos!
Fala!… que eu ouço o pipilar das aves!

Já viste às vezes, quando o sol de maio
Inunda o vale, o matagal e a veiga?
Murmura a relva: “Que suave raio!”
Responde o ramo: “Como a luz é meiga!”

E, ao doce influxo do clarão do dia,
O junco exausto, que cedera à enchente,
Levanta a fronte da lagoa fria…
Mergulha a fronte na lagoa ardente …

Se a natureza apaixonada acorda
Ao quente afago do celeste amante,
Diz!… Quando em fogo o teu olhar transborda,
Não vês minhalma reviver ovante?

É que teu riso me penetra nalma —
Como a harmonia de uma orquestra santa —
É que teu riso tanta dor acalma…
Tanta descrença!… Tanta angústia!… Tanta!

Que eu digo ao ver tua celeste fronte,
“O céu consola toda dor que existe.
Deus fez a neve — para o negro monte!
Deus fez a virgem — para o bardo triste!”

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