Em 22 de outubro de 1964, o filósofo e escritor francês Jean-Paul Sartre foi anunciado como o vencedor do Prêmio Nobel de Literatura. Entretanto, surpreendentemente, Sartre recusou tanto o prêmio quanto o valor monetário associado. Esta decisão, embora controversa, foi fundamentada em seus princípios pessoais e em sua visão sobre o papel do escritor na sociedade.
Por que Sartre recusou o Nobel da Literatura?
A recusa de Sartre ao Nobel não foi uma decisão impulsiva, tomada de última hora e no improviso. Foi uma decisão coerente com uma postura que ele mantinha há anos.
Em sua declaração à imprensa sueca, Sartre explicou que sempre rejeitara honrarias oficiais, como, por exemplo, sua recusa à Legião de Honra em 1945. Para ele, aceitar um prêmio como o Nobel poderia transformar o escritor em uma instituição, algo que ele considerava perigoso. Sartre acreditava que um escritor deveria atuar apenas através da palavra escrita e que qualquer honra oficial poderia criar uma pressão indevida sobre seus leitores.
Essa atitude baseia-se na minha concepção do empreendimento do escritor. Um escritor que adota posições políticas, sociais ou literárias deve agir apenas com os meios que são seus próprios — isto é, a palavra escrita. Todas as honras que ele possa receber expõem seus leitores a uma pressão que eu não considero desejável. Se eu assino Jean-Paul Sartre, não é a mesma coisa que assinar Jean-Paul Sartre, vencedor do Prêmio Nobel.
O escritor deve, portanto, recusar deixar-se transformar em uma instituição, mesmo que isso ocorra nas circunstâncias mais honrosas, como no presente caso.
Além de razões pessoais, Sartre também apresentou motivos políticos. Ele via o prêmio como uma tentativa de “branquear” seu envolvimento com o comunismo e suas posições políticas, claramente à esquerda radical.
Como eu estava politicamente envolvido, o estabelecimento burguês quis encobrir meus “erros do passado”. Ora, aí está uma admissão! E então me deram o Prêmio Nobel. Eles me “perdoaram” e disseram que eu merecia isso. Foi monstruoso!
Sartre enfatizou a importância de manter sua independência de instituições tanto ocidentais quanto orientais. Segundo ele próprio, não poderia aceitar o Nobel da mesma forma que não aceitaria um prêmio de instituições socialistas, como o Prêmio Lenin. Ele desejava que sua obra fosse julgada de forma independente, sem a influência de premiações.
Quem mais recusou o Nobel da Literatura?
Sartre não foi o único a recusar o Prêmio Nobel. Em 1958, o escritor soviético Boris Pasternak foi forçado a recusar o Nobel de Literatura devido à pressão das autoridades soviéticas, que viam o prêmio como uma afronta ao regime.
Outro exemplo notável foi o dramaturgo irlandês George Bernard Shaw, que em 1926 recusou o valor monetário do prêmio, alegando que já tinha dinheiro suficiente para suas necessidades. Shaw, no entanto, acabou aceitando o valor para financiar a tradução de literatura sueca para o inglês.
Le Duc Tho, laureado com o Nobel da Paz em 1973, também recusou o prêmio, argumentando que a situação no Vietnã, país devastado pela guerra, não justificava essa honraria.
O ato de recusar um Nobel é raro, mas em cada caso, revela-se uma complexa mistura de convicções pessoais, pressões políticas e visões sobre o papel das instituições internacionais.